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  • COP30: Carlos Lopes, enviado para África e a radiografia da cimeira de Belém do Pará
    O Brasil acolhe desde esta segunda-feira a 30a Conferência das Nações Unidas sobre o clima. O economista guineense Carlos Lopes é o enviado especial do evento para África, por decisão do chefe de Estado brasileiro, Lula da Silva. Este também docente universitário na cidade sul-africana do Cabo está, em Belém do Pará para esta COP30. Carlos Lopes, enviado especial da COP30 para África, e economista guineense, começa por nos revelar em que consiste a sua tarefa nesta cimeira. Somos sete para as regiões consideradas pelo Brasil como estratégicas para a discussão climática. No que me toca, eu responsabilizo-me pela África. Estive envolvido na Organização da Cúpula Africana do Clima, que teve lugar em Adis Abeba há cerca de um mês e, portanto, faço a ponte entre as lideranças africanas e a presidência brasileira para poder fazer com que esta COP ouça melhor cada uma das regiões. No meu caso, a África, mas também possa, digamos, articular as várias conexões que são necessárias para negociações desta natureza, que são sempre muito complexas.  E é sempre o mesmo chavão. Mas, ao fim ao cabo, um chavão acertado em relação à realidade, ou seja, um continente que padece sobremaneira das alterações climáticas e que pouco polui. Esta constatação continua a ser válida em 2025, na COP de Belém em relação a África ? Sim, eu penso que nós temos agora até uma narrativa mais forte sobre o facto de regiões como a África precisarem de muito mais foco nos problemas de adaptação climática... E menos na mitigação, que normalmente domina os debates. E isso graças ao Brasil, digamos, ter também a mesma preocupação e estar orientada na mesma direcção. Portanto, o Brasil oferece à África essa possibilidade de maior concentração na adaptação, que é, de facto, o que nos interessa.  Fala-se muito em perdas e danos, precisamente em mitigação. O que é que se pode esperar em relação a esse prisma, sendo que houve já anúncios feitos desde a pré-COP e agora o início da COP propriamente dita... por exemplo, o lançamento do Fundo de Florestas Tropicais para sempre. Na prática, há já avanços aí a registar ? Na realidade, é o único fundo novo que aparece nesta COP porque a presidência brasileira quis dar ênfase à implementação e não a novos acordos. Mas tratando-se de uma COP que tem lugar numa zona que é considerada a maior floresta mundial, achou oportuno que se lançasse, digamos, uma iniciativa particularmente orientada para as florestas tropicais e centrada sobretudo na protecção de três grandes zonas do planeta, que são a principal reserva florestal que é a Amazónia, a África, na Bacia do Congo e também a Indonésia e o Sudeste Asiático.   E, portanto, a inovação desse fundo é que ele tem características um pouco diferentes de tudo o que foi até agora lançado na COP, porque é um fundo para pagar aquilo que já existe e não para fazer coisas. Portanto, é para permitir a protecção da floresta existente, e com uma ênfase também nas populações locais: as populações indígenas, as comunidades locais, a quem será reservada a 20% da utilização dos fundos apropriados. E com, digamos, características que são menos de compensação, e que são mais de aposta e investimento no futuro através da conservação. Portanto, têm de facto uma inovação muito grande. É importante sublinhar que o Fundo já está, digamos, com contribuições anunciadas importantes, sendo que dos 5 biliões que foram anunciados, cerca de três são da Noruega, que é o país que toma a dianteira e vai muito para além até das expectativas que se poderia ter nesta etapa da discussão. E há, digamos, uma adesão muito importante neste momento política para a criação desse fundo.    Como é que é o ambiente aí, sendo que, uma vez mais, os Estados Unidos ficam de fora? É claro que já não é uma novidade. Em que medida é que o "climato-cepticismo", por assim dizer, continua a pairar como uma sombra sobre as negociações da COP?    As negociações deste ano não são tão importantes porque não se trata de conseguir mais. Há um mapa do caminho, como se chama, de Baku para Belém, que foi definido na COP 29 e que é o assunto principal de negociações. E à volta de quais são os montantes de financiamento que até agora não foram cumpridos, e qual é o nível de ambição que se tem que acrescentar em matéria de financiamento climático? Mas, para além disso, as outras discussões estão mais ou menos alinhavadas. Não vai haver grandes controvérsias. A ausência dos Estados Unidos vai-se fazer sentir em termos de resultados, porque não é só o facto de os Estados Unidos estarem ausentes do debate climático. É a importância que tem indirecta nos comportamentos, equipamentos, por exemplo, corporativos, regulatórios. O facto de, por exemplo, os financiamentos privados estarem muito orientados pelas preocupações da principal bolsa de valores que é a Bolsa de Valores de Nova Iorque e, portanto, acaba por ter resultados indirectos muito negativos e que vão muito para além de os Estados Unidos propriamente ditos fazerem ou não fazerem o necessário.    Que olhar é que se pode ter acerca da proposta da economista francesa Esther Duflo, que apresenta uma solução original e na COP 30 de Belém, com o economista indiano Abhijit Banerjee, que é o seu esposo, que ganhou com ela o Prémio Nobel da Economia em 2019, mais o economista americano Michael Greenstone, que foi conselheiro de Barack Obama ? Eles estão a propor um sistema de transferências de dinheiro em troca de acções ambientais. Acha que este sistema pode ter pernas para andar? Eles propõem um esquema em que os países ricos se comprometem a arrecadar fundos e a enviá-los directamente às entidades, às pessoas para as ajudar a se proteger contra os excessos do clima na forma de transferências financeiras ?   Digamos que não é tão original. Tem a ver com as várias iniciativas para regular de uma forma ética, a emergência de um mercado de carbono. Eu sou defensor de que, no caso da África, nós precisamos ter um mercado de carbono regulado pelos africanos e liderado pelo Banco Africano de Desenvolvimento, porque é assim que nós podemos contornar o facto de que do exterior se faz a certificação, se faz a taxonomia, se faz, digamos, o controlo daquilo que é verde e do que não é verde, o que é o bom e o mau carbono e qual é o valor do carbono? Portanto, isto não são coisas que podem ser decididas por outrém, devem ser decididas por aqueles que detém, de facto, uma espécie de crédito histórico de carbono que não contribuíram para o problema e estão a sofrer mais do que os outros. E, portanto, é necessário poder de facto, conseguir transferir aquilo que nós consideramos como problema, que é o problema da dívida de um aspecto financeiro para um aspecto de carbono.    É adquirido, portanto, que não se consegue cumprir a meta de um máximo de 1,5 graus de aquecimento do planeta. Já se está a trabalhar num patamar superior: de menos de dois graus e meio do aquecimento, é assim ?   É de 2,4 graus ! Mas eu acho que o problema maior é de que mesmo essa segunda meta, que é uma meta, digamos, de realismo, também não será atingida se não se fizerem muito mais esforços do que aqueles que estão anunciados. E nós temos ainda o déficit sempre verificado daquilo que se promete e daquilo que se faz. Portanto, há contribuições dos vários países anunciadas aqui na COP, porque este era o ano em que se deveria fazer a revisão dos planos nacionais. Apenas 100 países, mais ou menos, vão apresentar esses planos nacionais. Se tivermos sorte, chegar aos 100. Portanto, faltarão cerca de 80 e poucos países. Mas mais importante do que isso é que esses países que não estão presentes, digamos, na mesa, alguns deles são os maiores emissores e, portanto, nós temos aqui já, digamos, comprometimento muito menor do que anteriormente, mas daqueles que anunciam temos um nível de ambição que está em redução, em vez de aumento.    Como o senhor professor está, nomeadamente responsável pela parte africana. Eu pedir-lhe-ia que nos desse um pouco um olhar da dimensão dos africanos presentes em Belém. Em que estado de espírito é que viu as delegações chegarem? São de alto nível? Isso é promissor, a seu ver, em relação à visibilidade de África nesta conferência ?   Nós não temos delegações lideradas por chefes de Estado em grande número, não é? E também a nível ministerial, a presença é bastante limitada e há várias explicações para isso. Uma delas é o facto de que estamos quase com as mesmas datas com a cimeira do G20, em que a África, pela primeira vez, tem uma importância maior, porque está a hospedar a cimeira do G20 e é a primeira vez que a União Africana participa a pleno. E há uma série de países africanos convidados pela presidência sul-africana. Portanto, isso não joga a favor da COP. A segunda razão é a logística. A logística aqui em Belém é muito complexa, é também muito cara. Portanto, as delegações africanas acabaram por ser penalizadas por causa dessa logística. A terceira razão é o facto de nós estarmos numa COP em que, digamos, os principais protagonistas estão ausentes e, portanto, não vamos ter aqui os três principais emissores actuais, que são os Estados Unidos, a China e a Índia. E podemos juntar de todo o G7. A nível de lideranças vieram apenas cerca de três, portanto há 17 países do G20 e do G7 e do G20, que não estarão presentes. E isso é, digamos, um desincentivo para a própria presença de outros países, nomeadamente africanos.      No discurso de abertura, o presidente brasileiro, Lula da Silva, lembrava que, de facto, em 92 tinha havido um pontapé de saída importante já no Brasil em relação às questões ambientais. E esta conferência volta, então, ao Brasil e agora à a Amazónia e a Belém, onde se encontra o senhor professor.  O que é que nos pode dizer acerca, precisamente, da expectativa dos habitantes desta grande cidade da Amazónia brasileira, relativamente ao acolhimento desta conferência, para a qual o mundo inteiro tem os olhos virados ?     Há uma grande excitação em Belém e há uma atitude, digamos, de grande euforia que se vê, que se sente. É palpável. Portanto, há um défice de visibilidade na Amazónia e esta é uma grande oportunidade. É uma janela para se poder mostrar que a Amazónia é muito mais do que apenas árvores. Tem pessoas, tem cultura, tem gastronomia, tem cultura musical também muito importante para o Brasil o carimbó. Enfim, temos aqui uma atitude de grande celebração e uma atitude de grande entusiasmo, a tal ponto que não vai haver problema de números em termos de participantes da COP. Pode haver problema de participação internacional, mas todo o espaço que não for ocupado por presença de delegações internacionais seguramente é ocupado com grande pompa e circunstância e entusiasmo por participantes paraenses, amazónicos, brasileiros.    Belém do Pará é mesmo uma área particularmente vulnerável às alterações climáticas ?  Seguramente, porque a Amazónia tem um problema de desmatamento, mas também tem um problema de grilagem, como aqui se chama, de ocupação ilegal de terras. Tem um problema de populações que vivem em regime quase escravo, segundo a definição da Organização Internacional do Trabalho. E nestes três quesitos, um dos Estados que sofrem mais é justamente o Estado do Pará. Portanto, não estamos muito longe dos grandes problemas que afectam a Amazónia. 
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  • De Bissau para Belém do Pará, activista guineense leva projecto de piscicultura à COP30
    De Bissau para Belém do Pará, o jovem activista e empreendedor Dembo Mané Nanque, director-geral da Mana Nanque Piscicultura e fundador do “Puder di Bentana”, prepara-se para participar na Cimeira do Clima das Nações Unidas (COP30), que terá lugar em Belém do Pará, no Brasil, onde pretende partilhar a sua experiência no terreno e defender políticas climáticas que cheguem às comunidades mais vulneráveis. Antes de ir para a COP30, Dembo Mané Nanque passou pela capital francesa para encontrar parceiros internacionais. O objectivo é exportar a farinha de peixe da Guiné Bissau para França: “Em França há uma comunidade africana enorme e acreditamos que até ao próximo ano o nosso produto poderá estar no mercado”. Apesar do entusiasmo, reconhece que o caminho ainda é desafiante. “Tudo o que fazemos é graças aos nossos pequenos recursos e ao apoio de alguns parceiros internacionais. Mas acreditamos que poderemos abastecer o mercado internacional de acordo com as suas demandas”. O jovem empresário é também fundador e director-geral do “Puder di Bentana”, uma iniciativa de piscicultura com forte impacto social. “‘Puder di Bentana’ é um nome tradicional guineense. ‘Bentana’ é o que cientificamente chamamos de tilápia”, explica. “Trata-se de um projecto de aquacultura que nasceu com o intuito de combater a insegurança alimentar, o êxodo rural e os efeitos das mudanças climáticas.” A tilápia, que é o nome comum dado a várias espécies de peixes ciclídeos de água doce, é consumida fresca ou transformada em farinha. “A farinha tem mais procura porque as infra-estruturas rodoviárias, na Guiné-Bissau, são fracas e o transporte do peixe fresco é difícil. Por isso optámos pela desidratação e embalagem, seguindo os padrões internacionais”, refere. O projecto enquadra-se numa lógica de economia azul e circular, e tem sido apresentado em fóruns internacionais como exemplo de inovação africana. “Queremos mostrar que, com criatividade e empenho, é possível criar soluções sustentáveis a partir da nossa realidade”, sublinha. Depois de Paris, Dembo Mané Nanque seguiu para Lisboa e prepara-se agora para participar na COP 30, no Brasil, onde irá participar num painel de Jovens Afro-descendentes: “A minha intervenção tem como objectivo mobilizar parceiros e impulsionar políticas que beneficiem as comunidades vulneráveis. Queremos garantir que as decisões tomadas nas cimeiras internacionais cheguem efectivamente às zonas rurais”. Para o jovem activista, estar na COP 30 representa muito mais do que uma oportunidade pessoal. “Quero mostrar que a Guiné-Bissau não é apenas sinónimo de instabilidade. Há uma juventude informada, inovadora e pronta para agir”. No entanto, o jovem empreendedor lamenta a falta de apoio governamental. “Existe um apoio limitado e dirigido apenas a determinados grupos. Muitas vezes, por ser activista ambiental e empreendedor, encontro resistência por parte das autoridades. O Estado ainda não compreende que não estamos a sabotar nada, estamos a propor soluções e a querer liderar os desafios climáticos”. A 30.ª Conferência das Partes (COP30) da Organização das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, decorre de 10 a 21 de Novembro, em Belém do Pará, no Brasil.
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  • ChatGPT Atlas: uma revolução para o utilizador ou um sorvedouro de dados?
    A dona do ChatGPT lançou o Atlas, um navegador que promete mudar a forma como nos relacionamos com a internet. Além das novas formas de utilização, a Open AI visa um mercado que é actualmente dominado pelo Chrome, da Google. Cátia Pesquita, Professora em Ciência de Dados e Inteligência Artificial no Departamento de Informática da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, respondeu às perguntas da RFI para esclarecer as dúvidas sobre o significado do lançamento do ChatGPT Atlas. A Open AI, proprietária do ChatGPT, lançou um navegador com o famoso agente de inteligência artificial generativa no seu núcleo no dia 21 de Outubro. De momento, o ChatGPT Atlas está apenas disponível nos computadores da Apple. Os sistemas Windows, Android e iOS do iPhone vão ter de aguardar. Para a empresa de Sam Altman, trata-se de uma inovação que vai revolucionar a forma como nos relacionamos com a internet. Vamos ter ao nosso dispor uma ferramenta que vai aprender quem somos e transformar-se num super-assistente que nos ajuda a realizar as nossas tarefas de forma mais rápida e eficaz. Os críticos apontam para a falta de segurança do sistema, nomeadamente no que diz respeito aos dados privados do utilizador. Por outro lado, o Chat GPT Atlas é construído com base no Chromium, uma estrutura de código aberto desenvolvida pela Google e que está na base de navegadores como o Microsoft Edge ou o Duckduckgo. RFI: Estamos perante uma revolução, à semelhança do que viria a ser o iPhone no campo dos telemóveis. Ou trata-se de um ataque comercial à Google que domina o mercado dos navegadores com o Chrome? Cátia Pesquita: Eu acho que o lançamento do Atlas é, sem dúvida, uma ameaça directa à hegemonia do Google Chrome, que é actualmente o browser mais usado a nível mundial. E é interessante ver como a história às vezes se repete. Porque o Chrome ganhou esta preponderância, em parte, porque conseguiu integrar directamente o motor de pesquisa da Google, permitindo aos utilizadores fazerem pesquisas directamente na barra de endereços. Hoje em dia, temos uma estimativa de mais de 14 mil milhões de pesquisas feitas na Google a nível global, muito graças a esta integração. Agora, a Open AI vê neste browser uma oportunidade de capitalizar a sua base de utilizadores. Se estamos perante uma revolução, temos de esperar um pouco para saber. RFI: Quando refiro o iPhone é porque na altura, quando foi lançado, já existiam telemóveis. O que aconteceu com o dispositivo da Apple foi que os utilizadores começaram a ter acesso a outras possibilidades e isso veio revolucionar toda a forma como nos relacionamos com a internet. Há a possibilidade do ChatPT vir a fazer isto? Cátia Pesquita: Eu diria que é a capacidade de automatizar uma série de interacções online que vai ter esse potencial de revolução. A Open AI promete automatizar tarefas mundanas, como marcar uma visita ao restaurante ou uma consulta médica, tudo através desta integração da inteligência artificial directamente num browser. Isto, obviamente tem muitas vantagens, mas também riscos associados. RFI: Os mais jovens, em termos de busca de informação, já estão a alterar os seus comportamentos com o recurso à inteligência artificial generativa. Em que medida é que a aprendizagem que o agente vai fazer dos hábitos de navegação do utilizador, pode provocar um estreitar de vistas ainda maior, semelhante ao que sucede já com os algoritmos das redes sociais? Cátia Pesquita: A Open AI está muito ciente desta alteração dos comportamentos online e, na verdade, há poucos meses, em entrevista, o Sam Altman, o CEO da Open AI, revelou que o plano de expansão está a ser inspirado pela forma como os utilizadores mais jovens interagem com a plataforma. Enquanto as camadas de maior idade usam-no essencialmente como motor de busca para encontrar informação, os mais jovens estão a usar desde já o ChatGPT como um serviço pessoal de inteligência artificial para os ajudar a tomar as suas decisões no dia a dia. E, portanto, eu vejo o Atlas como um primeiro passo nesta estratégia. Só que esta personalização vem com um custo potencialmente muito elevado, porque para a termos, temos de permitir à Open AI registar toda a nossa actividade online. Mas eu acho que um dos maiores riscos não é apenas esta perda de controlo sobre os nossos dados ou a dependência excessiva na IA de que tanto falamos, mas aquilo também a que se refere que é esta perda de pluralidade de vozes e perspectivas. E na verdade, ao longo dos últimos 30 anos, a Internet tem sido um arauto desta pluralidade de vozes e perspectivas. Os motores de busca tradicionais, como a Google, listam diferentes fontes relacionadas com o tema de pesquisa, ainda que coordenadas por relevância, claro, mas o resultado de pesquisa que vai ser processado por IA, tarefas que são automatizadas por IA, têm um grande potencial de se resumirem ao ponto de vista partilhado pela maioria das fontes, estreitando horizontes. E é assim que os modelos são treinados para captar aquilo que é a maioria das opiniões. E, portanto, o grande desafio aqui vai ser garantir que as nossas pesquisas e interacções online reflictam a diversidade de ideias, opiniões, perspectivas da humanidade. Claro, sem esquecer que têm de ser fundamentadas em fontes fidedignas. A mim resta-me saber se os gigantes tecnológicos partilham desta preocupação. RFI: Isso implica também que os mais velhos, os educadores, cumpram esse papel de explicação aos mais jovens, que há mais mundo além daquilo que lhes é dado através do ecrã? Cátia Pesquita: Este é um tema extremamente complexo. Isto não basta apenas as preocupações da sociedade de uma forma alargada numa educação da população geral, mas onde temos que intervir antes, mas mais atrás, e intervir ao nível do desenvolvimento destas tecnologias. E como todas as tecnologias com potencial de disrupção, é uma espada de dois gumes. Por um lado, todos queremos poder usar inteligência artificial para automatizar as tarefas do dia-a-dia, as tarefas mais mundanas, mais aborrecidas ou até ter um browser que antecipa as nossas necessidades. Por outro lado, nós queremos garantir que temos privacidade, transparência, que mantemos a nossa autonomia nas nossas decisões. Só que para navegar este desafio, não só temos de educar a população geral para os riscos e benefícios de uma tecnologia que não vai parar de evoluir. Mas também temos de apostar na formação de profissionais que aliam o conhecimento técnico e científico às preocupações éticas. RFI: Relativamente ao nível da segurança dos dados, como é que é vista esta relação com o ChatGPT e com o ChatGPT Atlas? Cátia Pesquita: O Atlas, para poder funcionar de forma verdadeiramente personalizada, vai ter de registar toda a nossa actividade online. No entanto, os termos de utilização que estão agora públicos indicam que a autorização para que esses dados sejam utilizados para treinar os modelos da Open AI vem desligada por omissão. No entanto, não faltam vozes que nos relembram dos escândalos de privacidade e direitos de autor, etc., em que a OPA se tem visto envolvida nos últimos anos. Por isso, resta aqui saber se vamos confiar ou se vamos desconfiar. RFI: A Open AI e o Chat PT vão ser, como todos os outros agentes de inteligência artificial, vão ser sorvedouros do nosso conhecimento, da nossa existência? Cátia Pesquita: Eu acho que é na capacidade de consumirem enormes quantidades de dados que estes modelos recentes de inteligência artificial têm ganho as suas capacidades surpreendentes e quase sobre-humanas. A questão é que estamos a chegar ao final dos dados disponíveis online e as empresas correm com criatividade a tentar procurar novas fontes de dados que possam ajudar aos próximos passos de evolução destes modelos. Eu penso que o Atlas tem também por detrás essa motivação, uma motivação de conseguir extrair mais dados dos utilizadores que possam alimentar os algoritmos e, de certa forma, melhorar o seu desempenho e aumentar, obviamente, a sua preponderância no mercado. RFI: Pessoalmente, considera que a existência destas máquinas é um perigo ou uma oportunidade? Cátia Pesquita: Ambas as coisas é um perigo e é uma oportunidade. É uma oportunidade porque existem desafios no mundo que são demasiado complexos para que nós, humanos, com as nossas capacidades cognitivas, os consigamos resolver. Por exemplo, desafios na medicina personalizada e em nós conseguirmos compreender as relações entre os genes e doenças, que é uma das minhas áreas de investigação, são demasiado complexos para nós conseguirmos entender o manancial de dados e informação que estão a ser recolhidos a nível de investigação e, portanto, existe aqui uma oportunidade enorme para o bem da inteligência artificial nos ajudar, por exemplo, a atacar problemas tão prementes como o cancro ou as alterações climáticas. Por outro lado, existem riscos claros. E um risco claro é também a perda de capacidades da população ao confiar demasiado nestas ferramentas para se substituir a si mesmo na aprendizagem, no trabalho e na criatividade. E este é um desafio que a mim me toca também como professora, em que o uso responsável destas ferramentas como potenciadores e não como substitutos da inteligência humana. RFI: Para si o ChatGPT é mesmo a melhor IA do mercado ou beneficia de um fenómeno de marca? Cátia Pesquita: Eu acho que a grande vantagem que o ChatGPT tem não é apenas em termos do modelo de inteligência artificial que o alimenta, mas também da experiência de utilizador que a plataforma permite. Outras plataformas podem termodelos que atingem um desempenho igualmente bom em diversos benchmarks e análises, mas é a experiência de utilização do ChatGPT, os modos de interação, o próprio website e plataforma do ChatGPT que eu julgo que estão a contribuir para a grande fatia de mercado que a Open AI tem.
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  • Novo medicamento para prevenir e tratar VIH/Sida vai dar entrada no mercado angolano
    Um novo medicamento de prevenção e tratamento do VIH/Sida vai entrar no mercado angolano em breve. Trata-se do Lenacapavir, que funciona com duas injecções por ano e poderá custar 28 mil dólares por ano e por pessoa, com ajuda de financiamentos estatais. Este medicamento foi aprovado na União Europeia há alguns anos para o tratamento de pacientes com o vírus.   Em entrevista à RFI, Isabel Daniel, assessora de Informação Estratégica da ONU-Sida em Angola, explicou o funcionamento deste novo medicamente e as vantagens que representa para os cerca de 370 mil angolanos actualmente diagnosticados com o vírus.  RFI: Quais são os dados actuais sobre o VIH/SIDA em Angola? Isabel Daniel: As estimativas da ONU-SIDA em Angola para 2024 são de cerca de 370.000 pessoas que vivem com VIH, ou seja, uma prevalência de 1,6%. Deste grupo, 70% são mulheres, e cerca de 10% são crianças abaixo de 14 anos. No país, a prevalência é maior em algumas zonas.  RFI: Por exemplo? Angola tem 21 províncias. Lunda Sul, Lunda Norte, Cunene, Cubango, Moxico, todas estas províncias do Leste e Sul, têm uma maior prevalência do que o resto das outras províncias. RFI: Como se explica este facto? São províncias que fazem fronteira com países que têm uma prevalência maior que a nossa. Há também grupos mais vulneráveis em termos de comportamento e risco. Por serem províncias, por exemplo, com actividade de mineração, há então muita troca de bens e maior actividade sexual, o que aumenta o risco e os números. RFI: Relembremos como é que se transmite o vírus da SIDA? A principal transmissão é pela via sexual. Uma pessoa que vive com o vírus do VIH e que não faz tratamento, contém um alto número de vírus. Se tiver uma relação sexual desprotegida, pode então passar o vírus para outra pessoa. Pode ser também a contaminação de mãe para filho, durante a gestação, se não tiver a fazer o tratamento, a mãe pode transmitir o vírus através da placenta.  RFI: O que se sabe sobre este novo medicamento, o Lenacapavir, que vai entrar no mercado angolano? De acordo com o Instituto Nacional de Luta Contra a Sida (INLS), trata-se de um medicamento injectável recentemente lançado pela farmacêutica norte americana Gilead e aprovado na União Europeia para o tratamento de pacientes com o vírus. Sim, é uma inovação. Trata-se de um medicamento de acção prolongada. Funciona com duas injeções por ano. Para a prevenção do VIH é muito importante, porque é mais fácil de modo geral. Os grupos de maior risco conseguem então se proteger melhor. RFI: Quem é que são os grupos de maior risco? São os adolescentes, meninas e mulheres entre 15 a 24 anos, trabalhadores de sexo - pela actividade económica que exercem, têm maior risco - Homens que têm relações sexuais com outros homens também apresentam uma prevalência maior, pessoas transgénero e também pessoas em prisões, por falta de higiene e outros comportamentos associados, como o uso de droga, e o acesso mais limitado aos serviços de saúde. RFI: Como é que será assumido o custo do medicamento para cada beneficiário? De acordo com os documentos nacionais disponíveis e as avaliações, sabemos que o Estado angolano custeia cerca de 80% dos custos no combate contra a propagação do VIH. Há depois um certo suporte dos parceiros. RFI: Mas se formos até ao fim da cadeia para chegarmos ao utente. Quanto irá custar para, por exemplo, uma mulher com VIH comprar o medicamento?  Tem havido muita advocacia para que o preço inicial fosse reduzido. As últimas informações são de 28.000 dólares por ano e por pessoa. Então este seria um novo custo que o governo teria que incrementar dentro do plano estratégico para o combate do VIH. Lembrando sempre que um investimento agora é uma poupança no futuro. RFI: De acordo com o Plano Estratégico de Resposta ao VIH 2023-2026, Angola dispõe actualmente de 35 milhões de dólares. A ONU alerta que seriam preciso 145 milhões de dólares.  Exacto. O plano estratégico do VIH de Angola para os três anos de 2023 a 2026 estima que sejam necessários cerca de 580 milhões de dólares para fazer face à doença. Ou seja, anualmente, seriam 145 milhões de dólares. O Grupo Técnico de Monitoria de Angola fez então a análise em 2024 de quanto conseguimos alocar para esta resposta, e foi reportado que são 35 milhões de dólares. RFI: O que quer dizer que é preciso um investimento muito maior ainda? Exacto. Não só para prevenir e tratar, mas também para combater as discriminações. Uma em três pessoas vivendo com VIH não procura ajuda e cuidados devido ao estigma. De forma geral, em Angola houve muito progresso nos últimos dez anos, mas em termos de tratamento, apenas 50% das pessoas que vivem com VIH recebem tratamento. Esse número é muito inferior à meta da ONU de 95% de pessoas com tratamento. 
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  • A transição verde da China: De maior poluidor a líder da economia do futuro
     Vamo-nos projectar para 2060. Esta é a data limite em que a China afirmou querer atingir a neutralidade carbono. Luis Mah, professor desenvolvimento global no Instituto Universitário de Lisboa, analisa connosco esta viragem do maior poluidor mundial, responsável por 80% do aumento global das emissões de gases com efeito de estufa nos últimos 10 anos. A China tem vindo a posicionar-se como líder da transição energética global, apesar de continuar dependente do carvão. Para Luis Mah, professor de desenvolvimento global no Instituto Universitário de Lisboa, “a China está a descarbonizar não só por questões ambientais, mas também por ambições geo-económicas”. De facto, ao investir em tecnologias verdes, como a energia solar e eólica, pretende exportá-las para o Sul Global. “A China já vende mais tecnologia verde ao Sul Global do que ao Norte mais rico”, afirma o professor, destacando o seu papel crescente em África. Embora continue a construir centrais a carvão : “Estamos talvez a assistir ao pico do consumo de carvão, um passo essencial para a transição”. No plano internacional, o afastamento dos Estados Unidos sob a presidência de Trump oferece uma oportunidade: “Pequim vê aqui uma janela para se afirmar como líder climático mundial”, defende o universitário.
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Uma vez por semana, os temas que marcam a actualidade científica são aqui descodificados.
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