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  • Energia eólica em alto-mar desacelera no mundo e mira recuperação nas potências emergentes
    As energias renováveis, em pico de expansão, viveram um paradoxo em 2025: ao mesmo tempo em que superaram pela primeira vez o carvão na geração de eletricidade no mundo, os projetos de eólicas em alto-mar (offshore) recuaram. Na Europa e em potências como Japão e Índia, planos de novas instalações são adiados ou cancelados, em um contexto fragilizado pelo revés norte-americano no setor. Lúcia Müzell, da RFI em Paris A Agência Internacional de Energia (AIE) antecipa uma desaceleração da abertura de novos parques eólicos offshore até o fim da década. Em seu relatório anual publicado em outubro, a instituição reduziu em 27% a sua expectativa de novas capacidades até 2030. Diversos aspectos influenciam esse cenário: aumento dos custos de matérias-primas fundamentais, como aço e cobre, flutuações nas cadeias globais de suprimentos e desaceleração econômica mundial, com impacto na demanda de energia. Na Europa, o redirecionamento dos recursos para defesa, no contexto da guerra na Ucrânia, desmobilizou o impulso às offshores, mais onerosas. Em termos de volume de investimentos, a complexidade dos projetos torna a comparação com as outras fontes limpas desfavorável. "A necessidade de capital fixo é muito maior do que a eólica onshore, porque você tem que levar para o mar e, lá, você pode fazer instalações com muito maior capacidade”, salienta o professor do Instituto de Economia da UFRJ Nivalde de Castro, coordenador-geral do Grupo de Estudos do Setor Elétrico. "Enquanto que onshore você tem torres de 4, 5 ou 10 MW de capacidade instalada, no mar você tem a possibilidade de instalar 20, 30, 50 MW. E como está no mar, todo o sistema de transmissão também é muito mais caro.” Freio nos EUA e foco nos emergentes Os ventos do negacionismo climático de Donald Trump contribuem: o presidente congelou os projetos de energias renováveis nos Estados Unidos, afetando não apenas o desenvolvimento do setor no próprio país, como o acesso a equipamentos americanos pelos clientes do planeta. Entretanto, em um mundo na rota da descarbonização, a tendência a médio e longo prazos continua de crescimento, tanto nos países europeus como, principalmente, nos emergentes. O recorde de 9 gigawatts offshore instalados em 2024 deve despontar para 37 GW até o fim desta década, segundo a AIE. A China desponta na frente e deve responder por cerca da metade das novas capacidades. O Brasil, com quase metade da sua matriz energética e 90% da elétrica já renováveis, engatinha na via das eólicas em alto-mar. Nos últimos 15 anos, investimentos em solares e eólicas terrestres dispararam, impulsionados por subsídios. Mas os projetos offshore ainda não decolaram. "Não faz sentido a gente investir agora em uma fonte que é cinco vezes mais cara do que a energia solar, por exemplo. Mas a eólica offshore não está fora do radar do planejamento energético brasileiro”, frisa Castro. Brasil espera promover leilão em 2026 As regiões do Brasil com maior atratividade para os futuros parques são o sul, o norte e o nordeste. Elbia Gannoum, presidente da ABEEOLICA (Associação Brasileira de Energia Eólica), avalia que a maturação desta indústria no mundo só trará vantagens para o país. “Quando a tecnologia eólica começou a se tornar viável no mundo e a se tornar viável no Brasil, começamos a fazer as eólicas onshore. A mesma coisa aconteceu com a energia solar, e com as offshore, vai ser igual”, indica. "Essa tecnologia está no processo de ganho de escala e redução de custos. Em 2030, quando o Brasil implementar, estaremos numa situação muito diferente”, observa. Em janeiro, o país aprovou o marco regulatório do setor, e a expectativa é realizar o primeiro leilão para eólicas offshore em 2026. Mais de 100 projetos já solicitaram licenciamento ambiental do Ibama para lançar operações na costa brasileira, uma das maiores do mundo. "Você tem que criar um arcabouço regulatório muito sólido, que envolve um alinhamento de várias instituições públicas e ministérios, como o da Marinha, da Indústria e Comércio, o Ibama. A gente está a caminho, mas a gente não tem pressa – essa é que é a diferença”, afirma o professor da UFRJ. Os desafios do curtailment Além disso, o país tem o desafio de acomodar o equilíbrio entre oferta e demanda das novas plantas energéticas. O excesso de geração dos grandes parques renováveis tem levado à repetição dos casos de curtailment, como são chamados os cortes propositais de plantas, para evitar uma pane do sistema. O problema levou a prejuízos de R$ 5 bilhões desde 2023, segundo a ABEEOLICA, e impacta as decisões de investimentos nas eólicas onshore no país, que caíram dois terços no período. Para Castro, é hora de o Brasil amadurecer os sistemas de armazenamento do excesso de energia gerado pelas novas fontes, por meio de baterias químicas e hidráulicas. “Já teremos no ano que vem um leilão de sistemas de armazenamento de baterias. Como elas podem ser instaladas rapidamente, a solução já está a caminho”, aponta. "Mas nós vamos ter ainda um período de muitos cortes e há um risco de dar um apagão no ano que vem”, adverte o especialista. Apesar dos desafios, Elbia Gannoum não tem dúvidas de que, no futuro, o potencial brasileiro em renováveis vai atrair também investimentos estrangeiros de indústrias altamente dependentes de energias limpas. "O mercado interno brasileiro está, sim, passando por uma crise neste momento, associada ao próprio ritmo da economia brasileira. No entanto, a gente já percebe uma recuperação com a chegada de data centers, projetos futuros de hidrogênio verde, descarbonização das indústrias, no conceito de powershoring”, sublinha a presidente da associação do setor. "A gente espera que, a partir de 2027, a gente já tenha uma retomada mais forte dos investimentos em renováveis." A Conferência da ONU sobre as Mudanças Climáticas em Belém (COP30) colocou os potenciais do país sob os holofotes. Para encaminhar a transição energética, o mundo precisa triplicar as capacidades das renováveis até 2030.
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  • Portugal oferece treinamento a imigrantes em profissões com falta de mão de obra
    Em um contexto de leis de imigração cada vez mais restritivas em Portugal, uma iniciativa se destaca pela formação e integração de imigrantes. O programa Integrar, uma parceria entre o Departamento Nacional de Turismo, a confederação patronal do setor de hotéis, bares e restaurantes e a AIMA (Agência de Imigração e Asilo), visa formar um total 1.000 pessoas até o fim do ano para trabalhar nesses estabelecimentos. Com informações de Theo Raizon, da RFI O objetivo é selecionar estrangeiros, em situação legal ou em processo de regularização, para encontrarem emprego num setor que precisa de mão de obra. Na Escola de Hotelaria e de Turismo de Lisboa, acompanhamos uma aula sobre ovos. Laura, 34 anos, é angolana e aluna do curso de formação do programa Integrar. Ela não conseguiu emprego na sua área, psicologia do esporte, e teve de se requalificar. "Organizar minha documentação levou tempo. Por isso, recorri a este estágio. O que não é um problema, porque eu adoro cozinhar. Mas sem isso, seria difícil, porque a vida é complicada. Se você quer ficar aqui e não tem um emprego que lhe agrade, é difícil. O que eu amo são pratos quentes. Eu não tinha experiência, estou descobrindo, e é fascinante!", diz. Laura estava prestes a voltar para Angola e ficou feliz com a oportunidade. Ela faz um alerta a outros interessados em viver no país. "Não venha com visto de turista se pretende ficar no país. Venha com visto de estudante, visto de trabalho ou com uma situação que o ajude a evitar armadilhas. Imigrar já é difícil... Mas se não tiver o visto certo, ficará preso numa série de problemas, sem conseguir obter a documentação adequada ou regularizar a sua situação," diz. A jovem angolana é uma das 1.000 pessoas selecionadas para receber formação em turismo, hotelaria e gastronomia: três meses numa das 12 escolas de hotelaria de Portugal e um mês de estágio em uma empresa. Um programa que poderia parecer comum se não fosse pelo seu público-alvo específico. A motivação é fundamental, acredita João Antunes, instrutor de culinária. "São pessoas altamente motivadas. O que noto nestes grupos é que são pessoas muito interessadas. Pessoas mais velhas, com mais experiência de vida, que aproveitam estas oportunidades que lhes são oferecidas. É valorizado porque se vê claramente a vontade deles de aprender", destaca. O Hotel Vila Galé Ópera, em Lisboa, é um dos 329 estabelecimentos parceiros do programa Integrar. Foi no restaurante do hotel que Raas, um indonésio, encontrou o seu lugar. Até então, ele tinha se contentado com trabalhos temporários. "Em Portugal, como indonésio, é difícil encontrar emprego por causa do idioma. Então, procurei um instituto que ensinasse português. Comecei o estágio há três ou quatro meses e agora falo um pouco de português. Antes, eu só podia comer em lanchonetes de fast food", conta. Raas está feliz. Ele é um dos 15 estagiários do programa Integrar a serem contratados em regime permanente — uma raridade na indústria hoteleira. Contrato permanente "Um contrato permanente oferece segurança. Tem um período de experiência e depois eles são efetivados aqui no hotel, e isso lhes dá segurança e a possibilidade de alugar um apartamento, comprar uma casa, fazer um empréstimo no banco", explica Victor Ferreira, o gerente assistente do Vila Galé Ópera. O hoteleiro, assim como seus colegas, enfrenta uma rotatividade significativa no setor. Poucos funcionários se comprometem a longo prazo. "É muito difícil ter funcionários fixos a longo prazo, porque eles precisam trabalhar no fim de semana, no mês de agosto, quando todo mundo vai à praia, e isso é difícil", acrescenta. Os salários também são alvo de críticas em um setor exigente. No Hotel Vila Galé Ópera, Raas, que está apenas começando, ganha 1.200 euros brutos por mês, o que representa 330 euros a mais que o salário mínimo — aproximadamente R$ 7.400. Catarina Paiva é responsável pelo programa Integrar, junto à Autoridade Nacional de Turismo. Ela considera o treinamento um sucesso e se mantém distante do debate político sobre imigração. "Temos uma visão otimista e muito positiva da integração dos migrantes em nosso setor. Como eu disse, não queremos nos envolver no debate político. Nosso papel é garantir que aqueles que obtêm status legal tenham a oportunidade de construir uma carreira. Trata-se de garantir as condições necessárias para que as pessoas possam ser formadas em todo o país e de prestar apoio personalizado a quem estiver determinado a viver em Portugal", afirma. O programa Integrar pode servir de exemplo a outros setores. "O objetivo final do programa, e ficaríamos muito felizes se fosse alcançado, é a sua replicação. Gostaríamos de aproveitar o sucesso da nossa experiência para que sirva de modelo a outros setores profissionais capazes de integrar migrantes", conclui.  A parceria inédita entre o Departamento de Turismo de Portugal, empresários do setor e a agência de imigração será renovada em 2026. Isto representa um investimento de € 5 milhões para formação profissional no país. 
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  • Nova fase de desindustrialização desafia planos do governo francês para relançar produtos nacionais
    Como acontece desde 2018, o governo da França organizou esta semana uma reunião com investidores. Ao todo, cerca de 200 empresas participaram, nesta segunda-feira (17), da cúpula Choose France (Escolha a França, em tradução livre), que nesta edição reuniu apenas grupos franceses. O evento acontece em um momento em que a indústria nacional atravessa um período difícil. É uma oportunidade para anunciar projetos e novos investimentos na tentativa de relançar a indústria tricolor, quando o país enfrenta instabilidade política e concorrência internacional. De acordo com o Palácio do Eliseu, sede da Presidência, o objetivo é "celebrar a França que dá certo" e mostrar "que, para além dos debates políticos e midiáticos, existem empresas que continuam a investir". Esta cúpula dá continuidade a uma política mais ampla de relançar os produtos fabricados em território francês. Ela aconteceu dez dias depois da feira Made in France, ocorrida de 6 a 9 de novembro, com a presença do presidente Emmanuel Macron. "Eu acredito que o que fizemos em oito anos funciona: aumentamos a atratividade, diminuímos o desemprego, temos uma das taxas de crescimento mais fortes da Europa e os resultados estão lá. Nós encerramos um período de 12 anos de desindustrialização", declarou o presidente. O conselheiro econômico da Presidência da República, Matthieu Landon, explica o contexto em que acontecem as negociações para relançar a indústria francesa.  “Estamos em uma situação econômica difícil mundialmente, com grandes tensões comerciais como vimos recentemente, especialmente entre os Estados Unidos e a China. E o risco é que a Europa fique isolada entre essas duas grandes potências", diz. Ele acrescenta que a situação também é difícil no contexto europeu. "No último ano, no entanto, tivemos boas iniciativas para melhorar a competitividade europeia, unificar o mercado e proteger a Europa no contexto de guerra comercial. Mas é um contexto que continua difícil e que exige esforços para melhorar a competitividade europeia", completa. Ele destaca quais setores continuam competitivos e quais sofrem mais com a atual conjuntura internacional. "Nesse contexto, a economia francesa segue resiliente, o crescimento gira em torno de 1% e não vem essencialmente do consumo, mas é puxado pelo comércio exterior, pela indústria aeronáutica, de transporte e energia. Portanto, há setores que resistem a essa conjuntura difícil", destaca. Mas o próprio governo admite uma desaceleração da retomada industrial, projeto reforçado após a epidemia de Covid-19, quando a França percebeu sua dependência de insumos externos, especialmente chineses. "A França continua a gerar empregos, mas sabemos, porém, que a dinâmica de reindustrialização desacelera. Porém, temos um saldo ligeiramente positivo, com novos investimentos na descarbonização, de onde vêm boas notícias, enquanto os setores que enfrentam maior dificuldade são o ramo da química, dos automóveis e a indústria agroalimentar. Nesse contexto, a França se distingue positivamente em relação a seus vizinhos, somente a Espanha tem feito melhor entre os europeus. A França também conseguiu vencer a luta contra a inflação, que reflete no poder aquisitivo da população", conclui. Uma "nova fase de desindustrialização" Segundo o Ministério da Economia e Finanças da França, a ideia é "mostrar que existe uma realidade que vai além do contexto orçamentário difícil no país e da instabilidade internacional". Porém, apesar dos esforços governamentais para a reindustrialização, a realidade é sombria para muitas empresas francesas, com mais fechamentos do que aberturas de fábricas. No primeiro semestre de 2025, foram inauguradas 44 novas unidades industriais, em comparação com 82 fechamentos. Para Anaïs Voy-Gillis, pesquisadora associada da Universidade de Poitiers, o país enfrenta “uma nova fase de desindustrialização". “Nós tínhamos conseguido estabilizar a desindustrialização, mas estamos agora em uma nova fase de ruptura industrial. Mais fábricas fecham do que abrem, estamos em uma fase de desindustrialização”, diz. De acordo com a especialista, a instabilidade política na França "atrasa os investimentos empresariais". Entre os setores em crise está a indústria automotiva. A fornecedora alemã de autopeças Mahle, por exemplo, anunciou há alguns dias o fechamento de sua fábrica em Moselle, no leste do país. O setor agroalimentar também sofre. Outro exemplo é o fechamento, previsto para 2027, da histórica fábrica da Danone em Villefranche-sur-Saône, fundada em 1881, no sudeste do país. A forte concorrência internacional explica, em parte, essa desaceleração, principalmente por parte da China, que tem inundado o mercado europeu com seus excedentes de produção. Diante da forte concorrência, o governo francês assume uma política de proteção da indústria nacional. O Ministério da Economia anunciou investimentos de € 30,4 bilhões em 151 projetos espalhados por toda a França (€ 9,2 bilhões em novos projetos e € 21,2 bilhões em investimentos já anunciados por diversas empresas nos últimos 12 meses). Uma tentativa de mitigar as dificuldades enfrentadas pela indústria francesa. Na semana passada, um grupo de líderes empresariais publicou um artigo de opinião no Journal du Dimanche denunciando a tributação excessiva e a proliferação de regulamentações. O encontro com o chefe de Estado foi uma oportunidade para discutir todas essas dificuldades.
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  • Série de demissões na Amazon relança debate sobre efeitos da IA no mercado de trabalho
    A Amazon anunciou, na semana passada, a eliminação de 14 mil postos de trabalho. A empresa alegou que as demissões foram motivadas pelo desenvolvimento da inteligência artificial (IA). O anúncio reacendeu os piores temores sobre as consequências dessa tecnologia no mercado de trabalho. Pesquisadores entrevistados pela RFI analisam o que se pode esperar nos próximos anos. As demissões foram apresentadas pela Amazon como as primeiras de uma série de cortes que deve atingir 30 mil pessoas no grupo, que conta com 1,5 milhão de empregados em todo o mundo. Mas a empresa não é a única a reduzir sua força de trabalho em razão da IA. Embora o fenômeno ainda ocorra de forma gradual, os efeitos do avanço dessa tecnologia já são perceptíveis, sobretudo nos Estados Unidos. Na consultoria Accenture, 12 mil postos foram eliminados nos últimos três meses. Segundo a direção do grupo, tratava-se de funcionários “que não conseguiriam adquirir as habilidades necessárias para utilizar a IA”. Outros empregados foram alertados de que aqueles que não se adaptarem à nova tecnologia poderão ter o mesmo destino. A Microsoft, por sua vez, demitiu 15 mil funcionários neste ano, e muitos analistas associam essa redução à adoção da inteligência artificial. Mas quantos empregos estão realmente em risco? De acordo com um relatório de 2023 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), cerca de 2,3% dos empregos no mundo — e até 5% nos países desenvolvidos — poderiam, teoricamente, ser totalmente automatizados pela IA. Questão de produtividade Malo Mofakhami, economista e professor da Universidade Sorbonne Paris Norte, lembra que a chegada de novas tecnologias sempre levantou questionamentos sobre o emprego ao longo da história da sociedade industrial. No entanto, segundo o pesquisador, o desemprego gerado por essas inovações tende a ser menor do que o previsto. “Não vimos a extensão das perdas de empregos que os pesquisadores anteciparam. Houve um artigo muito famoso em 2017 que previa a eliminação de 40% dos postos de trabalho nos dez anos seguintes, nos Estados Unidos. Mas essa perda não se concretizou”, observa. “Para que ocorram perdas significativas de emprego, é preciso haver um aumento expressivo da produtividade. E, na verdade, o que os economistas observam agora é que não estamos vendo ganhos massivos de produtividade. Algumas empresas estão, de fato, se beneficiando dessa onda tecnológica e a Amazon é uma delas. Estamos observando ganhos econômicos, mas eles estão mais ligados ao aumento da participação de mercado do que a melhorias na produtividade”, explica. “Na realidade, a redução de empregos nos Estados Unidos está amplamente relacionada a uma conjuntura econômica menos favorável no período de recuperação pós-Covid. As empresas estão, consequentemente, diminuindo seus quadros de pessoal.” As possibilidades e potencialidades da IA, contudo, ainda não são plenamente conhecidas ou exploradas pelas empresas. Por isso, o impacto sobre a produtividade permanece limitado. Martha Gabriel, futurista e autora do best-seller Inteligência Artificial – Do Zero a Superpoderes, explica que o mercado tende a demorar para reagir ou compreender as perspectivas do futuro. "Tem um cenário bonito mais para frente? Tem, porque a gente começa a transferir os humanos para partes de trabalhos mais adequadas para o nosso cérebro, para o nosso tipo de atividade, por exemplo, pensamento crítico, análise de cenários, pensamento mais complexo, mas num primeiro momento, a tendência é o que está acontecendo com a Amazon”, diz. "Vão surgir empregos? Vão, mas muito rapidamente vão desaparecer e em uma velocidade nunca vista." Alguns especialistas comparam a revolução da IA à chegada da internet no mundo do trabalho. Para Martha Gabriel, os dois momentos são comparáveis, mas com velocidades diferentes.  "A gente pode fazer a comparação, sim, porque realmente a gente teve bolha, teve muita mudança de trabalho, surgiram várias profissões e várias outras acabaram desaparecendo", analisa. "A diferença agora é que a gente tem uma tecnologia inteligente. As outras tecnologias a gente mandava nelas, eram ferramentas. Essa não. E a segunda coisa é a velocidade. A velocidade que a gente tem em transformação no mercado, ela nunca foi vista antes. Então, a dificuldade aqui não é lidar com a transformação em si, se ela fosse ao longo do tempo, a gente conseguiria, como fizemos nas anteriores. O problema agora é a potência muito alta numa velocidade muito alta." Empregos afetados A tradução é uma das áreas mais afetadas pelo avanço da IA. No entanto, segundo Lucília Willaume, intérprete e tradutora com 20 anos de experiência, a tecnologia chega a um mercado já deteriorado pelo surgimento da internet. “Começou primeiro bom para nós, porque era uma ferramenta de pesquisa excelente, que nós precisávamos, mas aí abriu a porta para tantas outras coisas que escaparam ao nosso controle, ao controle da profissão. Mas agora o choque é maior”, explica. “A arte do bem escrever é secundária. O que as pessoas querem agora é que exista uma mensagem passada da forma 'menos pior' possível ao menor preço possível. Antigamente nós achávamos que a inteligência artificial fosse fazer a parte mais técnica, mais mecânica da tradução e que depois nós viríamos para revisar, redigir de novo. Só que isso leva tempo e tem que ser pago e a tendência não foi essa. A tendência foi sendo cada vez menos valorizar o trabalho humano”, lamenta Willaume, que se afastou da tradução e se concentra em trabalhos de interpretação.  “A gente foi vendo essa evolução dos dicionários, dos tradutores online. Mas aí, quando as IAs chegam, foi outro nível de qualidade da tradução. Pouco a pouco, esse mercado vai se modificando, as empresas contratam menos para traduzir e acabam contratando mais para revisar. As IAs fazem a tradução”, conta a tradutora Emily Bandeira, lembrando que para o trabalho de revisão, a remuneração é menor. “Vários colegas que trabalhavam com tradução passaram a ser revisores. Enfim, é uma mudança que vai ocorrendo aos poucos, mas ela é perene”, diz a tradutora, que também passou a trabalhar como intérprete.  Na Amazon, os empregos afetados concentram-se principalmente nos escritórios, e não nos armazéns. Entre as profissões mais vulneráveis estão, naturalmente, aquelas baseadas em processamento de dados e tarefas digitais facilmente automatizáveis, como análise de dados, contabilidade, suporte de TI, atendimento ao cliente e compras. Mesmo quando as demissões não resultam diretamente da automação, os cortes de pessoal podem ser um efeito indireto da inteligência artificial: as empresas precisam ajustar suas estruturas para recuperar os altos investimentos em infraestrutura exigidos por essa tecnologia. Após essa onda de demissões, a Amazon anunciou um investimento de US$ 5 bilhões na Coreia do Sul, destinado principalmente à construção de centros de dados de IA até 2031.
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  • Nobel de Economia de 2025 explica por que imposto sobre ultrarricos pode tirar a França da corrida da IA
    Philippe Aghion, professor do renomado Collège de France e do Instituto Europeu de Administração de Negócios (Insead), foi o pesquisador premiado com o Nobel de Economia em 2025. Em entrevista exclusiva, ele falou à RFI sobre alguns dos desafios econômicos da França. Em meio aos debates sobre o orçamento de 2026, ele alerta: com o imposto sobre grandes fortunas proposto por seu colega, o também economista Gabriel Zucman, a França pode literalmente perder o bonde da inteligência artificial. Em entrevista exclusiva à RFI, o economista Philippe Aghion, recém-laureado com o Prêmio Nobel de Economia de 2025, fez duras críticas à política fiscal francesa e alertou para os riscos que o país corre ao adotar medidas que, segundo ele, podem comprometer seu futuro tecnológico e econômico. Aghion iniciou sua análise comentando o impasse em torno da aprovação do Orçamento francês para 2026. Segundo ele, a ausência de um orçamento aprovado até o fim do ano seria grave, pois colocaria o país sob uma “lei especial” que impede decisões estratégicas, como investimentos em inteligência artificial. "É muito grave não ter um projeto de orçamento aprovado, porque entramos numa espécie de regime especial. Sem isso, o país entra em modo de emergência, só dá para pagar o funcionalismo. Não há espaço para decisões estratégicas, nem para investir em tecnologia de ponta como a inteligência artificial. Ficamos completamente paralisados", afirmou o Prêmio Nobel de Economia de 2025. O economista foi enfático ao criticar a proposta do Partido Socialista de implementar o chamado “Imposto Zucman” — uma taxa mínima de 2% sobre patrimônios superiores a € 100 mil, incluindo ativos não concretizados. Aghion citou o exemplo de Arthur Mensch, presidente da Mistral, uma das startups mais promissoras em inteligência artificial na França, avaliada em € 12 bilhões, mas que ainda não gera receita. “Com esse imposto, ele teria que vender ações ou buscar financiamento apenas para pagar tributos sobre um valor que não existe. Isso é desmotivador e pode levá-lo a fechar as portas ou mudar de país”, alertou. Leia tambémAlemanha lança supercomputador 'Júpiter' e cobra reação da Europa na corrida da IA Para Aghion, a valorização de empresas emergentes é volátil e incerta, e tributar ativos não realizados pode sufocar a inovação. “Com a Taxa Zucman, está terminado. A França escapa à inteligência artificial. Isso é certo”, declarou.  "Abusos" Aghion reconhece que os franceses querem mais justiça fiscal, mas propõe atacar o que ele chama de "abusos": empresas de fachada, manobras para escapar do imposto sobre a sucessão e a herança na França, e uso indevido de estruturas jurídicas, como as chamadas "holdings patrimoniais", para comprar bens de luxo.  "Tem gente que constitui uma holding na internet e é ela quem, no papel, compra seus chalés e aviões privativos, pagando muito menos imposto. Sou totalmente a favor de identificar, perseguir e combater fraudes e brechas como essa. Isso é legítimo. Pedimos a todos os franceses que se esforcem, não se pode então autorizar pessoas com mecanismos de otimização fiscal abusivos", avalia o especialista. “É preciso rastrear os abusos, como a criação dessas empresas falsas apenas para ajudar na transmissão de heranças e patrimônios. Sou totalmente a favor disso”, disse. Questionado sobre o programa econômico do partido de extrema direita Reunião Nacional (RN, sigla fundada pelo clan Le Pen em 1970, hoje presidida pelo jovem Jordan Bardella), que apresentou um orçamento paralelo com cortes de € 50 bilhões em gastos e € 14 bilhões em receitas, Aghion foi contundente: “São grandes amadores. Não são pessoas sérias. Não confiaria a eles as rédeas da França”. O economista reconheceu, no entanto, o sentimento de abandono que leva parte da população a apoiar o RN. “Há uma falência do Estado republicano [na França]. As pessoas sentem que a escola já não oferece as mesmas oportunidades, que não serão tratadas se adoecerem. Tentaram a direita, a esquerda, e foram abandonadas. Então tentam o que não foi tentado”, explicou, dizendo ter "máximo respeito" pela angústia dos eleitores. Leia tambémNa corrida mundial pela IA, UE aposta em proteção de dados para se diferenciar de excessos de concorrentes Aghion também desmontou as premissas do programa do RN, apontando que as economias previstas com imigração e preferência nacional são inconstitucionais e superestimadas. “As economias sobre fraudes são fantasiosas. Se fosse possível economizar € 5 bilhões com fraudes, já teríamos feito isso”, ironizou. Ele também criticou a proposta de cortar contribuições à União Europeia, lembrando que os agricultores franceses seriam os primeiros prejudicados. "Atraso europeu" Ao abordar o tema da inteligência artificial, Aghion lamentou o atraso europeu frente aos Estados Unidos, que desenvolveram 70% dos modelos fundamentais de IA entre 2017 e 2023. “O drama é que os grandes pesquisadores de IA são europeus e franceses. Temos engenheiros, matemáticos e cientistas da computação excelentes”, afirmou. Segundo ele, o problema está na falta de um ambiente favorável à criação de empresas inovadoras na França. “O high-tech é feito em outro lugar. Se quisermos que seja feito na Europa, precisamos de um verdadeiro mercado único, capital de risco, investidores institucionais e políticas proativas de inovação disruptiva”, afirmou. Para Philippe Aghion, o futuro da economia francesa depende de políticas públicas que incentivem inovação e apoio às empresas de tecnologia. Ele falou ainda sobre o que mudou em sua vida depois do Nobel.  "Eu ainda não me dou conta de que recebi o Prêmio Nobel, então ainda não consigo realizar... Eu não acreditava de jeito nenhum, em todo caso, que pudesse ganhar... E agora, é preciso ter cuidado com o que se diz. É preciso medir mais as palavras, porque, efetivamente, você sente que sua palavra conta mais quando você é um Nobel. E é preciso, pouco a pouco, acostumar-se com a ideia de que você não pode mais falar da mesma maneira", concluiu.
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Entrevistas com economistas, analistas de mercado, investidores e políticos, para explicar e comentar questões econômicas internacionais. O papel do Brasil e dos países emergentes na economia mundial.
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