Que recompensa eu busco?
Tolstói escreveu em Guerra e Paz que as grandes batalhas da história não se travam apenas nos campos, mas dentro do coração humano. Entre ambições e medos, o que realmente move cada um de nós?É fácil pensar que as pessoas agem por ideal, por vocação, por amor — mas se olharmos mais fundo, veremos um labirinto de intenções escondidas. O coração humano é, como diz o Salmo, um abismo: “Impenetrável é o homem, seu coração é um abismo.”Na verdade, quase tudo na vida é uma batalha silenciosa entre a pureza e o egoísmo. Mesmo nas obras mais belas — uma música, uma oração, um gesto generoso — podem se misturar intenções turvas: o desejo de ser admirado, de ser elogiado, de ser reconhecido. Mas o olhar de Cristo, que penetra o mais fundo de nós, não nos condena — Ele nos purifica.É nesse olhar que começa a verdadeira retidão de intenção.Um sacerdote me sugeriu, para manter o coração livre, parar de olhar o número de visualizações de seus vídeos no YouTube. “Melhor não saber”, dizia ele. “Assim o coração não se apega.” Há sabedoria nisso. Porque o coração, como uma planta, cresce para onde recebe mais sol. E se a luz que o alimenta é a do aplauso, ele morre de sede quando vem o silêncio.Mas há outro caminho: o de olhar para Deus, e não para os números. “Quando deres esmola, não saiba tua mão esquerda o que faz a direita”, disse Jesus. Ou, em outras palavras: faz o bem, e esquece que fez. Essa é a batalha mais profunda — não contra os outros, mas contra o próprio orgulho.A mortificação e a oração são as armas.A primeira limpa o terreno; a segunda o enche de vida.Maurice Blondel dizia: “O que queremos, quando queremos tudo o que queremos?”No fundo, é sempre o amor.Por mais distorcido que esteja, é sempre o amor que nos move. No final de Guerra e Paz, um personagem desiludido encontra a redenção não na glória, mas no perdão. Ele descobre que o amor — o amor de uma mulher, o amor misericordioso de Deus — “lhe explicou tudo”. Essa frase, mais do que filosófica, é teológica: “O amor me explicou tudo. O amor resolveu tudo.”Quando o coração é tocado por esse amor, até os nossos dragões se tornam aliados. Mesmo o orgulho, a vaidade, o desejo de ser visto, podem ser transformados em força se forem integrados — se o olhar for purificado pela presença de Deus. Até os olhos que antes julgavam o mundo passam a ver como olhos de Cristo: olhos verdes de esperança, que enxergam a presença de Deus em cada detalhe, em cada pessoa, em cada sinal verde do caminho.E então a batalha pela retidão de intenção se torna uma dança: a alma, enfim, aprende a olhar só para Ele — e a se alegrar com o que apenas Ele vê.📌 “O amor me explicou tudo. O amor resolveu tudo.” 📖 (São João Paulo II, poema da juventude)📚 ReferênciasSl 64(63), 7 – “Impenetrável é o homem, seu coração é um abismo.”Mt 6, 1-6 – “Quando deres esmola, não saiba tua mão esquerda o que faz a direita.”Rm 8, 13 – “Se viverdes segundo a carne, morrereis; mas, pelo Espírito, vivereis.”Ef 1, 4 – “Deus nos escolheu antes da fundação do mundo para sermos santos em sua presença, no amor.”Guerra e Paz, de Liev Tolstói.Maurice Blondel, L’Action (1893).Live do Prof. Diego Reis sobre a Presença: https://www.youtube.com/live/m0QOkOWz...