Ele viveu 12 anos nas ruas e encontrou uma família no ferro velho
Sonhar com São Paulo era sonhar com oportunidades. Mas a realidade foi outra e a rua se tornou a casa do Carioca por duros 12 anos. Entre noites frias e dias de incerteza, Carioca fez um amigo, vizinho de calçada, que lhe ofereceu um caminho para sobreviver: se tornar catador e aprender a garimpar.No ferro velho, ele entendeu que o que chamam de lixo tem valor. Aprendeu a separar, carregar, vender. E ali, entre os montes de material reciclável, encontrou um teto. O dono do ferro velho ofereceu um espaço, um barraco simples, mas seu. O primeiro colchão foi um pedaço de papelão, o travesseiro, um bloco de cimento. Mas ele dormiu tranquilo, protegido pela primeira vez em anos.Foi ali que conheceu Jo. A menininha vinha todo dia, levando o almoço de quem trabalhava no ferro velho. No meio das idas e vindas, os dois criaram um vínculo. Até que um dia, com a pureza de uma criança, a Jo olhou para o Carioca e disse: “Se eu tivesse um pai, queria que fosse igual a você.”Aquela frase virou uma chave. Ele, que tinha se acostumado a sobreviver, sentiu a responsabilidade de ser referência. Mas a aproximação não passou despercebida. A mãe de Jo estranhou o quanto a filha falava sobre aquele homem chamado Carioca. Ele foi até a casa dela, explicar que estava certa em se preocupar com a filha.Só que a amizade entre o Carioca e a mãe da Jo foi crescendo. A amizade virou carinho, o carinho virou amor. E assim ele teve a chance de construir uma família.Mas o sentido da sua vida não parou ali. Em 2002, soube que a prefeitura apoiaria grupos organizados de catadores. Com outros 46 trabalhadores, formaram uma cooperativa. Hoje, sua cooperativa tem 352 cooperados, seis unidades, um centro escola. Mais do que coletar e separar materiais, formam e qualificam pessoas, resgatam jovens antes que a criminalidade os adote, dá oportunidade a quem saiu do sistema prisional, a quem envelheceu e o mercado de trabalho descartou.O Carioca entende que os catadores salvam o planeta diariamente. Mas, acima de tudo, salvam uns aos outros. E foi assim que ele encontrou seu lugar no mundo: no amor de uma filha, no encontro com sua esposa e no trabalho que dá dignidade a tantos. Porque, quando se faz algo com verdade, tudo encontra seu caminho.